Conforme prometido no meu último artigo (princípios penais) resolvi dedicar um único artigo para o princípio da insignificância, tamanha sua importância.
O conhecimento da insignificância é crucial para os que militam na seara penal tendo em vista que se presente no caso concreto, leva a atipicidade do fato, ou seja, o réu é absolvido .
Em um movimento de Abrandamento do direito Penal, a jurisprudência tem aplicado fartamente tal princípio em várias àreas do direito, inclusive temos precedente para drogas (consumo).
Vamos lá?
1-Princípio da insignificância/ princípio da bagatela/ ou infração bagatelar própria
Quem primeiro tratou sobre o princípio da insignificância no direito penal foi Claus Roxin, em 1964.
Tal princípio da insignificância não tem previsão legal no direito brasileiro. Trata-se de uma criação da doutrina e da jurisprudência.
Para a posição majoritária, o princípio da insignificância é uma causa supralegal de exclusão da tipicidade material. Se o fato for penalmente insignificante, significa que não lesou nem causou perigo de lesão ao bem jurídico.
Logo, aplica-se o princípio da insignificância e o réu é absolvido por atipicidade material, com fundamento no art. 386, III do CPP.
O princípio da insignificância atua, então, como um instrumento de interpretação restritiva do tipo penal. Por isso costuma-se estudá-lo no primeiro substrato do crime (no fato típico).
1.1 ) Requisitos
Para o reconhecimento da insignificância, exige-se:
- mínima ofensividade da conduta
- ausência de periculosidade social
- reduzido grau de reprovabilidade do comportamento
- ínfima lesão ao bem jurídico
1.2 ) Hipóteses que merecem estudo apartado (para quem deseja um maior aprofundamento):
- crimes militares
- valor sentimental do bem
- crimes cometidos com violência ou ameaça à pessoa
- súmula 589 stj
- crimes contra a administração pública (súmula 599 stj)
- lei de drogas s
- contrabando
- crimes contra a fé pública
- crimes ambientais
- • rádio pirata
1.3) Pequena quantidade de munição
Desacompanhada da arma de fogo, permite a aplicação do princípio da insignificância ou bagatela. STJ. 5ª Turma. AgRg no HC 517.099/MS, Rel. Min. Joel Ilan Paciornik, julgado em 06/08/2019. O STJ, alinhando-se ao STF, tem entendido pela incidência do princípio da insignificância aos crimes previstos na Lei nº 10.826/2003 ( Estatuto do Desarmamento), afastando a tipicidade material da conduta quando evidenciada flagrante desproporcionalidade da resposta penal.
1,4) O princípio da insignificância pode ser aplicado para atos infracionais
1.5) É possível a aplicação do princípio da insignificância aos crimes ambientais
Devendo ser analisadas as circunstâncias específicas do caso concreto para se verificar a atipicidade da conduta em exame. STJ. 5º Turma. AgRg no AREsp 654.321/SC, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 09/06/2015.É possível aplicar o princípio da insignificância para crimes ambientais. STF. 2ª Turma. Inq 3788/DF, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em 1º/3/2016 (Info 816).
1.6) crime de descaminho e crimes fiscais
O valor máximo considerado insignificante no caso de crimes tributários e descaminho é de 20 mil reais (tanto para o STF como para o STJ). Essa a posição majoritária.
Em 2018, foi adotado o parâmetro estabelecido nas Portarias 75 e 130 do Ministério da Fazenda para aplicação da insignificância aos crimes tributários federais – ou seja, o limite de R$ 20 mil, já que abaixo disso a Fazenda Nacional não ajuíza a cobrança do crédito tributário.
Vale lembrar que ainda que aquele entendimento dissesse respeito somente a crimes relativos a tributos de competência da União, é possível aplicar o mesmo raciocínio ao plano estadual, quando houver lei local que dispense a execução fiscal abaixo de determinado valor.
1.7) Situações que inviabilizam a aplicação da Insignificância
1.7.1) Porte de drogas para consumo pessoal. O tema aguarda posicionamento do STF - tema 506 do STF
STJ: não é possível aplicar o princípio da insignificância
A jurisprudência de ambas as turmas do STJ firmou entendimento de que o crime de posse de drogas para consumo pessoal (art. 28 da Lei nº 11.343/06)é de perigo presumido ou abstrato e a pequena quantidade de droga faz parte da própria essência do delito em questão, não lhe sendo aplicável o princípio da insignificância
STJ. 6ª Turma. RHC 35920 -DF, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 20/5/2014. Info 541/ STJ. 5ª Turma. HC 377.737, Rel. Min. Felix Fischer, julgado em 16/03/2017/ STJ. 6ª Turma. AgRg-RHC 147.158, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 25/5/2021.
STF: Há um precedente da 1ª Turma, aplicando o princípio.
STF. 1ª Turma. HC 110475 , Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 14/02/2012. Recentemente, houve empate na votação (2x2) e houve a consequente concessão do Habeas Corpus: STF. 2ª Turma. HC 202883 AgR, Relator (a) p/ Acórdão Min. Gilmar Mendes, julgado em 15/09/2021.
1.7.2) Inaplicabilidade do princípio da bagatela no caso do crime previsto no art. 34 da Lei 9.605/98 (PESCA)
Art. 34. Pescar em período no qual a pesca seja proibida ou em lugares interditados por órgão competente: Obs: apesar de a redação utilizada no informativo original ter sido bem incisiva (“O princípio da bagatela não se aplica ao crime previsto no art. 34, caput c/c parágrafo único, II, da Lei 9.605/98”), existem julgados tanto do STF como do STJ aplicando, excepcionalmente, o princípio da insignificância para o delito de pesca ilegal. Deve-se ficar atenta (o) para como isso será cobrado no enunciado da prova aso concreto: realização de pesca de 7kg de camarão em período de defeso com o uso de método não permitido. STF. 1ª Turma. HC 122560/SC, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 8/5/2018 (Info 901). Outro caso concreto: realização de pesca com rede de oitocentos metros e apreensão de oito quilos de pescados. STF. 2ª Turma. HC-AgR 163.907-RJ. Relª Min. Cármen Lúcia, julgado em 17/03/2020.
1.7.3) Súmula 589-STJ: É inaplicável o princípio da insignificância nos crimes ou contravenções penais praticados contra a mulher no âmbito das relações domésticas. STJ. 3ª Seção. Aprovada em 13/09/2017, DJe 18/09/2017.
1.7.4: Outras hipóteses que não se aplicam o principio da insignificância (Merecem estudo apartado para quem deseja um maior aprofundamento):
- Furto qualificado
- Moeda falsa;
- Tráfico de drogas;
- Contrabando (há decisões autorizando a aplicação no caso de importação ilegal de pouca quantidade de medicamento para uso próprio);
- Roubo (ou qualquer crime cometido com violência ou grave ameaça)
OBS: Observem que o princípio da bagatela imprópria não é a mesma coisa que principio da insignificância. A bagatela imprópria permite que o julgador deixe de aplicar a pena em razão desta ter se tornado desnecessária. Normalmente, aplica-se o referido princípio em casos em que a culpabilidade do agente é ínfima, quando não existem antecedentes criminais na sua folha corrida, o dano causado pelo delito é reparado, a culpa é admitida pelo sujeito ativo, enfim, quando, da análise dos elementos do caso concreto, verifica-se que não há a necessidade de aplicação da pena. Nessas circunstâncias, o julgador, com base no artigo 59 do Código Penal, poderá deixar de aplicar a pena. seria tratado como causa suprelegal de extinção da punibilidade pois diz respeito à necessidade
Espero que tenha ajudado :O)
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Ah Segue link para o texto sobre princípios do direito penal: https://danicoelho1987.jusbrasil.com.br/artigos/1710925943/principios-do-direito-penal
Fonte: Mapa mental retirado do https://studymaps.com.br/principio-da-insignificancia/